GRUPO MALAGUETA

domingo, 24 de maio de 2009

 

O CASO DA ARANHA
Mário de Andrade

"Este primeiro dia de Paraíba tem que ser consagrado ao caso da aranha. Não é nada importante porém me preocupou demais e o turismo sempre foi manifestação egoística e individualista.
Cheguei contente na Paraíba com os amigos, José Américo de Almeida, Ademar Vidal, Silvino Olavo me abraçando. Ao chegar no quarto pra que meus olhos se lembraram de olhar pra cima? Bem no canto alto da parede, uma aranha enorme, mas enorme.
Chamei um dos amigos, Antônio Bento, pra indagar do tamanho do perigo. Não havia perigo. Era uma dessas aranhas familiares, não mordia ninguém, honesta e trabalhadeira lá ao jeito das aranhas. Quis me sossegar e de-fato a razão sossegou, mas o resto da minha entidade sossegou mas foi nada! Eu estava com medo da aranha. Era uma aranha enorme...
Tomei banho, me vesti, etc. fui jantar, voltei pro quarto arear os dentes, ver no espelho se podia sair pra um passeinho até a praia de Tambaú, mas fiz tudo isso aranha. Quero dizer: a aranha estava qualificando a minha vida, me inquietava enormemente.
Passei e foi um passeio surpreendente na Lua-cheia. Logo de entrada, pra me indicar a possibilidade de bom trabalho musical por aqui, topei com os sons dum coco. O que é, o que não é: era uma crilada gasosa dançando e cantando na praia. Gente predestinada pra dançar e cantar, isso não tem dúvida. Sem método, sem os ritos coreográficos do coco, o pessoalzinho dançava dos 5 anos aos 13, no mais! Um velhote movia o torneio batendo no bumbo e tirando a solfa. Mas o ganzá era batido por um piazote que não teria 6 anos, coisa admirável. Que precocidade rítmica, puxa! O piá cansou, pediu pra uma menina fazer a parte dele. Essa teria 8 anos certos mas era uma virtuose no ganzá. Palavra que inda não vi, mesmo nas nossas habilíssimas orquestrinhas maxixeiras do Rio, quem excedesse a paraibaninha na firmeza, flexibilidade e variedade de mover o ganzá. Custei sair dali.
Os coqueiros soltos da praia me puseram em presença da aranha. O passeio estava sublime por fora mas eu estava impaciente, querendo voltar pra ver se acabava duma vez com o problema da aranha. Nuns mocambos uns homens metodicamente vestidos de azulão, dólmã, calça e gorro. Eram os presos. São eles que fazem as rodovias do Estado e preparam os catabios. Não fogem. E não sei porque não fogem.
E fiquei em presença da aranha outra feita. Olhei pro lugar dela, não a vi. Foi-se embora, imaginei. De-repente vi a aranha mais adiante. Está claro que a inquietação redobrou.. De primeiro ela ficara enormemente imóvel, sempre no mesmo lugar. Agora estava noutro, provando a possibilidade de chegar até meu sono sem defesa. Pensei nos jeitos de matá-la. Onde ela estava era impossível, quarto alto, cheio de frinchas e de badulaques, incomodar os outros hóspedes, fazer bulha. A aranha deu de passear, eu olhando. Se ela chegar mais perto, mato mesmo. Não chegou. Fez um reconhecimentozinho e se escondeu. Deitei, interrompi a luz e meu cansaço adormeceu, organizado pela razão.
Faz pouco abri os olhos. A aranha estava sobre mim, enorme, lindos olhos, medonha, temível, eu nem podia respirar, preso de medo. A aranha falou:
- Je t'aime".

5 comentários:

Cúmplices disse...

Mário de Andrade descreve a paixão absurda que uma aranha sentia por ele,desde o primeiro dia em que a viu.Ele tentava disfarçar,tentou se distrair com as danças nas ruas, queria mata-la,mas na verdade a aranha queria vigia-lo e conseguir um jeito de se aproximar sem correr o risco de morrer só para se declarar a ele.

marfi disse...

Conta a história de uma aranha que se apaixona por ele,onde ele tenta fugir de qualquer jeito.

As inseparáveis disse...

Nesta obra de Mário de Andrade ele relata o medo que ele tem de araquinídeos, no caso da aranha, em que ele tenta fugir dela a todo custo, mas que ela percebendo o medo dele, ela expõem seus sentimentos em relação a ele. É um caso típico de amor a primeira vista, como ocorre na vida real entre duas pessoas.

Turma do Chaves disse...

Desde a primeira vez que viu a aranha , não conseguiu tira-la da cabeça , pelo medo é claro.Tentou se distrair com outras coisas como sair para um passeio a Lua-cheia, mas quando voltou seu medo se tornou maior ainda. Por outro lado , a aranha não parecia ter tanto medo assim , mas estava cautelosa, e com o tempo conseguiu chegar perto do Humano , e dizer o que sentia. Uma historia , que particularmente me fez rir com sua criatividade.

Turma do chaves disse...

um texto onde relata uma viagem do personagem para Paraiba mas foi meio amedrontada por uma aranha em seu quarto que segundo seus amigos era boazinha e trabalhadeira mas ele mesmo assim continuaou a teme-lá e a fugir dela e ela se apaixounou por ele.