A interação!

segunda-feira, 22 de junho de 2009

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Parabéns pela interação ocorrida na postagem Declaração de Amor...Este era o objetivo do blog.Até! Priscila.

GRUPO: CAÇA CONHECIMENTOS

segunda-feira, 1 de junho de 2009

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A SRA. STEVENS
Mário de Andrade

- Mme. Stevens.
- Sim, senhora, faz favor de sentar.
- Fala francês?
- ... ajudo sim a desnacionalização de Montaigne.
- Muito bem. (Ela nem sorriu por delicadeza.) O Sr. pode dispor de alguns momentos?
- Quantos a Sra. quiser. (Era feia.)
- O meu nome é inglês, mas sou búlgara de família e nasci na Austrália. Isto é: não nasci propriamente na Austrália, mas em águas australianas, quando meu pai, que era engenheiro, foi pra lá.
- Mas...
- Eu sei. É que gosto de esclarecer logo toda a minha identidade, o sr. pode examinar os meus papéis. (Fez menção de tirar uma papelada da bolsa aranha-céu.)
- Oh, minha senhora, já estou convencido!
- Estão perfeitamente em ordem.
- Tenho a certeza, minha senhora!
- Eu sei. Estudei num colégio protestante australiano. Com a mocidade me tornei bastante bela e como era muito instruída, me casei com um inglês sábio que se dedicava à Mefatísica.
- Sim senhora...
- Meu pai era regulamente rico e fomos viajar meu marido e eu. Como era de esperar, a Índia nos atraía por causa dos seus grandes filósofos e poetas. Fomos lá e depois de muitas peregrinações, nos domiciliamos nas proximidades dum templo novo, dedicado às doutrinas de Zoroastro. Meu marido se tornara uma espécie de padre, ou milhor, de monge do templo e ficara um grande filósofo metafísico. Pouco a pouco o seu pensamento se elevava se elevava, até que desmaterializou-se por completo e foi vagar na plenitude contemplativa de si mesmo, fiquei só. Isto não me pesava porque desde muito meu marido e eu vivíamos, embora sob o mesmo teto, no isolamento total de nós mesmos. Liberto o espírito da matéria, só ficara ali o corpo de meu marido, e este não me interessava, mole, inerte, destituído daquelas volições que o espírito imprime à matéria ponderável. Foi então que adivinhei a alma dos chamados irracionais e vegetais, pois que se eles não possuíssem o que de qualquer forma é sempre uma manifestação de vontade, estariam libertos da luta pela espécie, dos fenômenos de adaptação ao meio, correlação de crescimento e outras mais leis do Transformismo.
- Sim senhora!
- Como o Sr. vê, ainda não sou velha e bastante agradável.
- Minha...
- Eu sei. Com paciência fui dirigindo o corpo do meu marido para um morro que havia atrás do templo de Zoroastro, donde os seus olhos, para sempre inexpressivos agora, podiam ter, como consagração do grande espírito que neles habitara a contemplação da verdade. E o deixei lá. Voltei para o bangalô e fiquei refletindo. Quando foi de tardinha escutei um canto de flauta que se aproximava. (Aqui a Sra. Stevens começa a chorar.) Era um pastor nativo que fora levar zebus ao templo. Dei-lhe hospitalidade, e como a noite viesse muito ardente e silenciosa, pequei com esse pastor! (Aqui os olhos da Sra. Stevens tomam ar de alarma.)
- Mas, Sra. Stevens, o assunto que a traz aqui a obriga a essas confissões!...
- Não é confissão, é penitência! Fugi daquela casa, horrorizada por não ter sabido conservar a integridade metafísica de meu esposo e concebi o castigo de...
- Mas...
- Cale-se! Concebi meu castigo! Fui na Austrália receber os restos da minha herança devastada e agora estou fazendo a volta ao mundo, em busca de metafísicos a quem possa servir. Cheguei faz dois meses ao Brasil, já estive na capital da República, porém nada me satisfez. (Aqui a Sra. Stevens principia soluçando convulsa.) Ontem, quando vi o Sr. saindo do cinema, percebi o desgosto que lhe causavam essas manifestações específicas da materialidade, e vim convidá-lo a ir pra Índia comigo. Lá teremos o nosso bangalô ao pé do templo de Zoroastro, servi-lo-ei como escrava, serei tua! Oh! Grande espírito que te desencarnas pouco a pouco das convulsões materiais! Zoroastro! Zoroastro! Lá, Tombutu, Washington Luís, café com leite...
Está claro que não foram absolutamente estas as palavras que a Sra. Stevens choveu no auge da sua admiração por mim (desculpem). Não foram essas e foram muito mais numerosas. Mas com o susto, eu colhia no ar apenas sons, assonâncias, que deram em resultado este verso maravilhoso: "lá, Tombutu, Washington Luís, café com leite". Sobretudo faço questão do café com leite, porque quando a Sra. Stevens deu um silvo agudo e principiou desmaiando, acalmei ela como pude, lhe assegurei a impossibilidade da minha desmaterialização total e, como a coisa ameaçasse piorar, me lembrei de oferecer café com leite. Ela aceitou. Bebeu e sossegou. Então me pediu dez mil réis pra o templo de Zoroastro, coisa a que acedi mais que depressa.
Aliás, pelo que soube depois, muitas pessoas conheceram a Sra. Stevens em São Paulo.

GRUPO: POPILITCHULAS

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OS SAPOS
Manuel Bandeira

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos!

O meu verso é bom
Frumento sem joio
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas . . ."

Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei"
- "Foi!"- "Não foi!"- "Foi!" - "Não foi!"

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- "A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo."

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;

Lá, fugindo ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio.

GRUPO: MARFI

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A MULHER AUTOMÁTICA
Oswald de Andrade

GRUPO: XIRIBIRIBINHAS

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A MULHER AUTOMÁTICA
Oswald de Andrade

GRUPO: A TURMA DO CHAVES

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A MULHER AUTOMÁTICA
Oswald de Andrade

(De São Paulo) - Qual é o seu cargo?
- Esteno-dáctilo-serpente-contralto-secretária...
- Isso é novidade. Eu ouvi no rádio, naquele debate sobre a mulher moderna: esteno-dáctilo-serpente-secretária - A mulher atual!
- Ainda tem mais! Ponha glamour!
- Que é isso?
- Glamour é assim como eu sou. De concurso!
O homem pálido que esperava há duas horas examinou com os olhos a morena iodada no coral solto do vestido, sandálias de purpurina, cabelo lustroso, brincos, balangandãs e pulseiras, um beiço em ciclâmen por Salvador Dali.
- O senhor sabe? Comprei ontem um leque que cheira. É formidável! Da América!
A voz grossa trauteou "La vie en rose".
- Dei o fora no meu darling porque ele não me levou à boîte para ver o Charles Trenet. Fui com Mister Ubirajara.
- Quem é Mister Ubirajara?
- Acho que é canadense. Um gordo do anúncio. Tem gaita e possui um guarda-roupa perfeito. Dois ternos por dia! Me levou a Santo Amaro num 1950 formidável. Tomamos muitos drinks.
Na ante-sala de móveis mecânicos o telefone ressou.
- Aposto que é o turco! Deixa tocar... Ele fala "negócio". Quer saber do "negócio" dele. Como se eu estivesse aqui para dar informações!
O telefone insiste.
- O senhor sabe? Um marinheiro contrabandista foi ao meu apartamento levar uns cortes de tropical e uns relógios suíços. Não falava nenhuma língua. Disse por gestos que era marinheiro, da Suíça. Enquanto ele se distraiu bati um relógio-pulseira e pus ele pra fora. Começou gesticulando que faltava alguma coisa. Banquei a boba. O homem falou baiano: - Deixe de besteira moça! Não gosto disso não! Me dá o relógio!
O telefone continuava. Ela arrancou num gesto o fone e berrou:
- Não me encha! Não é aqui!
Desligou violentamente. A voz do outro lado ficou dizendo humildemente:
- Esbéra, mucinha!
- Que esbéra, nada! Se ele ligar outra vez dou o telefone do Cemitério do Araçá. Vou fazer ele falar com defunto!
Houve um silêncio rápido. O homem pálido perguntou:
- A senhora é contralto?
- Sou. O que a mulher tem de melhor é a voz! - gritou desaparendo numa porta volante. - A voz e a saliva!

GRUPO POPILITCHULAS

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CAFÉ COM LEITE
Antonio Maria

É preciso amar, sabe ? Ter-se uma mulher a quem se chegue, como o barco fatigado à sua enseada de retorno. O corpo lasso e confortável, de noite, pede um cais. A mulher a quem se chega, exausto e, com a força do cansaço, dá-se o espiritualíssimo amor do corpo.Como deve ser triste a vida dos homens que têm mulheres de tarde, em apartamentos de chaves emprestadas, nos lençóis dos outros! Como é possível deixar que a pele da amada toque os lençóis dos outros! Quem assim procede (o tom é bíblico e verdadeiro) divide a mulher com o que empresta as chaves. Para os chamados “grandes homens” a mulher é sempre uma aventura. De tarde, sempre. Aquela mulher que chega se desculpando; e se despe, desculpando-se; e se crispa, ao ser tocada e cerra os olhos, com toda força, com todo desgosto, enquanto dura o compromisso. É melhor ser-se um “pequeno homem”.Amor não tem nada a ver com essas coisas. Amor não é de tarde, a não ser em alguns dias santos. Só é legítimo quando, depois, se pega no sono. E há um complemento venturoso, do qual alguns se descuidam. O café com leite, de manhã. O lento café com leite dos amantes, com a satisfação do prazer cumprido. No mais, tudo é menor. O socialismo, a astrofísica, a especulação imobiliária, a ioga, todo o asceticismo da ioga… tudo é menor. O homem só tem duas missões importantes: amar e escrever à máquina. Escrever com dois dedos e amar com a vida inteira.

GRUPO AS INSEPARÁVEIS: TIRO de Amadeo de Souza Cardoso

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